Alexandre Linares (*)
Morreu neste sábado o escritor Victor Leonardi. Historiador, ativista, roteirista e poeta, professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), Leonardi participou da luta contra a ditadura, fez parte do Grupo Outubro e esteve na fundação da Organização Socialista Internacionalista (OSI). Viajante apaixonado, sua vida é cheia de causos e boas histórias que são contados nas entrelinhas de seus livros.
Em 1967, perseguido pela ditadura, ele partiu para a França, para um exílio que durou sete anos. Viveu 1968 em Paris, enquanto estudava sob orientação do historiador francês Pierre Broué. Um pequeno e inspirador fragmento de sua vida pode ser lido na biografia publicada em sua página na internet, Victor Leonardi, site oficial do escritor.
Sua vida é cheia de causos e boas histórias que são contados nas entrelinhas de seus livros.
Seu livro Jazz em Jerusalem, publicado pela Nankin Editorial (Editora de Valentim Aparecido Facciolli e Antônio Amaral Rocha), é o livro mais bonito que já li na vida. Lembro do impacto do livro em mim e na minha amiga arqueóloga Kelly Brandão. Um livro inspirador.
Mas sua obra é vasta, com livros de história, ensaios, contos e poesias.
História da indústria e do trabalho no Brasil (Global/Ática), escrito em parceria com seu amigo Francisco Foot Hardman, hoje professor e pesquisador da Unicamp, aprofunda as pesquisas sobre a gênese da história do proletariado brasileiro e formou uma geração de militantes da classe trabalhadora do país.
Leonardi fez parte do conselho editorial da editora e livraria Kairós, onde ajudou na publicação de diversos volumes da coleção “Materialismo Histórico” (aquela com os livros de capas amarelas no design fabuloso de Massao Ono).
Além de integrar o Grupo Outubro, ele esteve na fundação da Organização Socialista Internacionalista (OSI) e do Jornal O Trabalho e participou do processo político de fundação do PT. O economista Markus Sokol certa vez me disse que Victor Leonardi era o melhor propagandista. Para meu camarada Markus Sokol, com todo o seu rigor, afirmar isso, suas atividades de formação devem ter sido de fato fabulosas.
Troquei alguns emails e mensagens pelo orkut com ele anos atrás.
Uma das histórias fabulosas de sua vida foi o projeto que desenvolveu de refazer com alunos a viagem que o naturalista alemão Alexander von Humboldt fez em 1799 pelos rios amazônicos venezuelanos e brasileiros, como o próprio Leonardi conta em seu site.
Seu roteiro do filme Atlântico Negro – Na Rota Dos Orixás (1998), dirigido por Renato Barbieri, é um trabalho lindo. Mais recentemente, Leonardi foi autor da ideia e participou do roteiro de Tesouro Natterer (2024), também dirigido por Renato Barbieri, que foi vencedor da 29ª edição do “Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade” e recebeu vários prêmios no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
Seus livros valem ser lidos. E vale a pena assistir aos filmes que roteirizou.
Sua história de vida é o roteiro de uma aventura profundamente humana.

Tive a oportunidade de organizar a edição do livro Fulvio Abramo, meio século de luta pela 4ª Internacional (Editora Nova Palavra), cujo principal texto é uma entrevista feita por Victor Leonardi e Pierre Broué com o camarada Fúlvio Abramo, veterano militante do grupo trotskista Liga Comunista Internacionalista (LCI), líder da greve dos jornalistas de 1961, a que conquistou o piso salarial profissional, e um dos fundadores do PT. A entrevista foi feita em 1979 e publicada originalmente em 1982, na revista francesa Cahiers Leon Trotsky.
Queria tanto ter entregue um exemplar do livro para ele.
Meu abraço fraterno e solidário à sua mulher, Márcia, aos filhos Rodrigo e Juliana Leonardi e a toda a família. E um especial a seu amigo, que acompanhou de perto esses últimos momentos, nos informando da evolução da situação, professor Francisco Foot Hardman.
Que a terra lhe seja leve, Victor Leonardi. Obrigado.
(*) Alexandre Linares, jornalista, editor e professor. É dirigente sindical e integrante do conselho fiscal de Cemap-Interludium, responsável pelo Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa (Cemap).
Uma pequena biografia:
Nascido em 15 de outubro de 1942, na cidade de Araras (interior de São Paulo), Victor Paes de Barros Leonardi inicialmente pensou em ser médico, como o pai, mas desistiu para se dedicar à agricultura. No início da década de 1960, trabalhou por quase três anos no sul da Bahia, plantando seringueiras. Após esse período, ingressou na Faculdade de Direito de Ilhéus (BA). Foi aí que publicou seus primeiros textos, no pequeno jornal que fundou em 1963, “O Democrata”, publicação considerada subversiva após o golpe cívico-militar de 1964.
Perseguido, mudou-se para São Paulo e em 1967 exilou-se na França, acompanhado de sua primeira mulher, Nenilda Garcia Marinheiro, a Nena. De lá, só voltou ao Brasil em 1974. Como escritor, construiu uma vasta obra, com livros de poesia, ensaios e ficção, além de publicações coletivas na área da História. Apaixonado por viagens, ele conheceu mais de 80 países ao longo da vida.
Leonardi morreu em São José dos Campos, onde vivia com a mulher, Márcia. Deixa ainda dois filhos, Rodrigo e Juliana Leonardi.
Redação de Simone de Marco, diretora de Comunicação de Cemap-Interludium.
A foto que abre este post é de @euh_madu, e foi tirada da página de Victor Leonardi no Facebook. A da Expedição Humboldt é do site do escritor.

