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Memória de uma imprensa alternativa

Jornais alternativos

Vamos digitalizar os jornais Movimento, Opinião e Versus!

Cemap-Interludium começa 2019 comemorando: vai fazer a digitalização dos jornais Movimento, Opinião e Versus, três importantes veículos alternativos de resistência democrática na época da ditadura. Nosso projeto “Memória de uma Imprensa Alternativa”, que prevê a digitalização e a divulgação dessas coleções, que integram o acervo do Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa (Cemap), foi um dos dez selecionados pela Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo para receber recursos do Edital de Apoio à Digitalização de Acervos.

Movimento, Opinião e Versus não eram porta-vozes de grupos sindicais ou revolucionários, mas jornais que surgiram durante o período da ditadura no Brasil como alternativa à grande imprensa, muito mais suscetível à censura e outras formas de controle do governo. Eles ocuparam em boa parte o vácuo deixado pelos jornais de esquerda, que foram postos na ilegalidade e praticamente deixaram de existir.

Seu impacto como fonte de denúncias, ou simplesmente como espaço para temas culturais e assuntos locais censurados nos jornalões, foi imenso e é uma parte da nossa história que merece ser preservada e divulgada. Ou, como diz Lúcia Pinheiro, diretora-geral de Cemap-Interludium: “Os acervos artísticos e documentais têm o poder de conscientizar sobre a identidade e a trajetória histórica das lutas, da cultura e das pessoas nelas implicadas, contextualizadas no período e fatos pesquisados.”

Com os recursos do edital, será possível contratar profissionais para realizar este ano a digitalização propriamente dita dos exemplares – são mais de mil – e disponibilizá-los para consulta pública. Passar esses jornais para um meio digital tem duas funções importantes, democratizá-los e garantir sua preservação, como resume muito bem Sonia Troitiño, coordenadora do Centro de Documentação e Memória (Cedem), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), que tem a custódia do acervo do Cemap. É importante destacar, aliás todo o apoio que tivemos do Cedem durante o processo de preparação e apresentação do projeto.


Um pouco sobre os jornais alternativos

O rolo compressor da ditadura contra os jornais que não se alinhavam levou muitos jornalistas a se unirem para fundar pequenos jornais em que pudessem expressar mais livremente suas opiniões e discutir o país. Os jornais alternativos, como ficaram conhecidos, eram publicados no formato tabloide, mais barato, e juntavam a análise política e econômica a matérias culturais e ao humor, criando um modelo que se disseminou por todo o país – centenas de jornais de vida mais ou menos breve foram publicados. O site Memórias da Ditadura faz um apanhado sobre essa história.

Ainda hoje é interessante ler as matérias publicadas, pela grande qualidade de seus textos e para ter uma perspectiva histórica. Corrupção, violência, abuso de direitos humanos, demagogia são problemas muito mais antigos do que as turbulências políticas dos últimos anos sugerem. Mesmo submetida à censura, a imprensa alternativa foi capaz de discutir muitas das mazelas do Brasil real que os grandes jornais não podiam, ou não se atreviam a publicar.


As coleções que Cemap-Interludium vai digitalizar:

Opinião

O jornal Opinião nasceu de uma aliança entre o empresário Fernando Gasparian e um grupo de jovens jornalistas de oposição, liderados por Raimundo Rodrigues Pereira, que vinha da revista Realidade. Semanal, abertamente de oposição, lançou seu número 0 em 23 de outubro de 1972, no Rio de Janeiro. Com ênfase na análise econômica, especialmente as contradições do “milagre econômico”, o Opinião teve a colaboração de muitos intelectuais brasileiros e estrangeiros e publicava uma sessão fixa com artigos do francês Le Monde. Chegou a vender quase 40 mil exemplares em bancas. A partir da oitava edição, passou a sofrer censura prévia pesada, o que prejudicou sua qualidade. Em 1975, a aliança se rompeu, Gasparian demitiu Raimundo Pereira, e a maior parte da redação deixou o jornal em solidariedade a ele. O Opinião continuou a circular até 1977, quando Gasparian decidiu fechá-lo, por não suportar mais a censura.

Movimento

O jornal Movimento foi fundado em 1975 por Raimundo Pereira e seu grupo, em São Paulo, com um modelo diferente: era uma sociedade anônima, com ações distribuídas entre seus jornalistas e apoiadores. O ponto forte do semanário foram as denúncias contra a ditadura e as campanhas pela anistia e pela libertação dos presos políticos, entre outras. Foi submetido à censura prévia da sua primeira edição até o nº 153, de 5 de junho de 1978. Com o fim da censura, sofreu pressões da receita federal e cisões que afetaram sua circulação. Em 1981, os atentados da extrema direita, com invasões de sucursais e bombas em bancas que vendiam jornais alternativos foram a gota d’água. Muitos jornaleiros deixaram de vender o semanário, que acabou fechando em novembro de 1981, depois de 334 edições.

versus nº 1

Versus

Já o jornal Versus, lançado em 1975 em São Paulo pelo jornalista Marcos Faerman, se destacava pela estética de revista, com um projeto gráfico diferenciado e vanguardista, que abusava de imagens e ilustrações. Bimestral, dava bastante ênfase à América Latina e aos aspectos culturais; em suas páginas havia de tudo um pouco: jornalismo, literatura, poesia, fotografia, quadrinhos… O jornal chegou a vender 35 mil exemplares. Nos seus últimos anos, Versus passou a viver um conflito interno, entre jornalistas que defendiam uma publicação mais voltada para o debate intelectual, e os que queriam um foco mais político, composto principalmente por militantes da Convergência Socialista. Em 1978, Faerman deixou o jornal, que acabou fechando em meados do ano seguinte.


Cedem também conclui digitalização do Fanfulla

Fanfulla

E falando em preservação, o Cedem também está comemorando a conclusão do processo de digitalização do periódico Fanfulla, fundado em 1893 pela comunidade italiana no Brasil. Em dezembro, o Cedem anunciou que, por meio de uma parceria firmada com o Centro de Apoio à Pesquisa Sérgio Buarque de Hollanda (CAPH), da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, 80 rolos de microfilmes com edições do início da circulação até 1931 foram digitalizados, completando a coleção do jornal, que está disponível para pesquisadores.

Inicialmente publicado apenas aos domingos e em língua italiana, o periódico passou por várias transformações ao longo de sua vida. Em 1941, passou a ser editado em português, e desde 2014, tornou-se um informativo digital, publicado apenas na internet em versão bilíngue.

O Cedem fica na Praça da Sé, 108 – 1º andar (SP). Interessados em consultas aos acervos podem entrar em contato pelo telefone (11) 3116-1701 ou pelo e-mail pesquisa@unesp.br.

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