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Mais trabalho, menos educação!

Danilo Chaves Nakamura*

Em maio de 2014, publicamos aqui o texto Mais Educação – Quando as grandes expectativas saem de cena, com o intuito de levantarmos questões sobre o programa Mais Educação da prefeitura de São Paulo. Sem nenhuma intenção de idealizar o passado, apontamos como na gestão da prefeita Luiza Erundina, o então secretário de Educação, Paulo Freire, buscou reorganizar a educação do município aproveitando a energia social da sociedade civil recém-saída da ditadura militar. Os documentos da época afirmavam que a educação pública é um direito e a escola um espaço onde a população deve ser chamada para a construção do saber.

Numa tentativa de trazer para o presente esse passado democrático, em meados de 2013, o prefeito Fernando Haddad e o secretário Cesar Callegari lançaram o programa Mais Educação. Eles retomaram a ideia de educação como direito e encenaram uma consulta pública que, além da baixa participação, teve como devolutiva uma “participação social” que apenas reafirmava o que alguns documentos oficiais anunciavam de antemão.

Mais Educação: quando as grandes expectativas saem de cena

O presente texto é fruto da inquietação que atinge grande parte dos educadores vinculados à rede municipal de ensino de São Paulo. Afinal, a que veio essa atual reestruturação do ensino? Por que a ênfase na ideia do “direito de aprendizagem”? Como se deu a chamada consulta pública? A diversidade das vozes foi considerada? Longe de conseguir apresentar respostas consistentes para essas perguntas, o texto procura rememorar um momento histórico anterior em que a formulação da educação como direito era uma “ideia-força” que projetava uma sociedade livre. Resgatar essa memória talvez nos permita apontar para o significado da noção de “direito de aprendizagem” apresentada pela atual gestão.

A educação pública e o direito ao ensino de qualidade

Quando se fala de escola pública e do desempenho dos alunos que nela estudam, se fala da baixa qualidade, dos adolescentes e jovens desinteressados, das famílias que não se responsabilizam pela educação dos filhos, dos professores despreparados, entre outras coisas como, por exemplo, o Maluf dizer que professora reclama do salário por ser mal casada ou o Serra falar que o problema do desempenho dos alunos de São Paulo é responsabilidade dos filhos dos imigrantes, ou seja dos nordestinos que foram para a cidade grande.

Um dos problemas da escola pública é decorrência direta do autoritarismo e do desprezo da elite em relação aos pobres e excluídos. Anísio Teixeira, mais de 50 anos atrás, já dizia que quando as escolas públicas foram abertas para os pobres, negros e excluídos, reduziram a carga horária, suprimiram disciplinas e amontoaram os alunos em três ou até quatro turnos. Ou seja, bastava ensinar a ler e escrever para que pudessem ser explorados como mão de obra.

Quem luta sempre ganha: professores de Salvador derrotam o Alfa e Beto!

Não são poucas as lutas sindicais ou populares que terminam com os trabalhadores se sentindo derrotados por não conseguirem suas principais reivindicações. Muitas vezes até mesmo quando se conseguem conquistas parciais em uma greve parte dos militantes critica a direção do movimento por considerar que era possível avançar e obter melhores conquistas.

Eu sou um dos que se colocam ao lado do que nos ensina o professor Antônio Cândido, ao dizer que todas as conquistas sociais obtidas pelos trabalhadores, desde a época em que os operários eram mandados ao trabalho sob chicotada na Inglaterra, só foram conquistadas pela luta dos trabalhadores que lutavam por uma nova sociedade, que fosse capaz de derrotar a exploração e a opressão do capitalismo. O problema é quando os próprios trabalhadores deixam de reconhecer que foram eles próprios que conquistaram com luta os direitos hoje existentes, como, por exemplo, quando um operário diz que o 1º de Maio é o dia do trabalho e não do trabalhador.

E qual o motivo que me levou a escrever sobre isso?

Matrícula: seu lugar é na escola

Uma das reivindicações da pauta de negociação da greve dos professores municipais é o retorno da matrícula às escolas e o fim do sistema de compatibilização iniciado em 2011, com o Sistema de Cadastro de Matrículas de Alunos que o então prefeito Kassab implantou nas escolas municipais. Os professores entendem que o atual governo tem o compromisso político de reverter o prejuízo que a compatibilização tem causado aos filhos da classe trabalhadora que procuram a escola pública e não podem ter seus direitos negligenciados.

As artimanhas do dr. Callegari

Os professores da rede municipal de São Paulo estão em greve desde o dia 3 de maio. A greve vem se arrastando há quase 15 dias, deixando mais de 900 mil alunos e inúmeras famílias numa incerteza. De um lado, os professores reclamam por melhores salários, condições de trabalho e cumprimento de acordos firmados nas gestões passadas. De outro, a Secretaria de Educação, chefiada por Cesar Callegari, vem tentando deslegitimar a greve, dizendo que ela é “abusiva” e “manipulada” pelo sindicato. Em entrevista a rádio CBN, o secretário falou que está diante de uma “guerra de informações”. Se “guerra de informação” significa o uso da mídia para vencer o adversário a qualquer custo, podemos dizer que os ataques da Secretaria de Educação começaram no mês passado.

A educação no balcão de negócios do sr. Haddad

“(…) é o Estado que, ao contrário, necessita receber do povo uma educação muito rigorosa.” (Karl Marx)

No dia 26 de outubro de 2012, o candidato Fernando Haddad disse – em debate eleitoral transmitido pela Rede Globo – que honraria os compromissos já firmados com o magistério, ou seja, que seu governo incorporaria as gratificações e as bonificações nos salários. O adversário José Serra prometeu que daria um reajuste acumulado de 25%, uma decisão já encaminhada por seu vice, Alexandre Schneider, secretário municipal de Educação na gestão de Gilberto Kassab. Haddad, em sua tréplica, procurou desmascarar a promessa de Serra, afirmou que esse aumento é uma lei já aprovada e garantiu que o futuro governo do PT cumpriria tudo o que já foi firmado com a categoria.1Assista ao vídeo do debate no YouTube.

Haddad foi eleito. E com um grande apoio dos professores da rede municipal. Além das palavras do debate da campanha, esse eleitorado resolveu dar um crédito ao programa de governo do PT, que promete transformar a cidade de São Paulo numa “cidade educadora”. Segundo o documento, a atual gestão transformará São Paulo em “uma cidade que procura valorizar e formar os profissionais de educação, articulando carreira, jornada e piso salarial, que procura fortalecer o trabalho em equipe e com isso articular os equipamentos públicos e criar novas práticas pedagógicas e inovar os espaços educacionais”.2Ver o programa de governo do PT. Soma-se à credibilidade que o eleitorado concedeu a Haddad a desconfiança que os cidadãos – os professores especialmente – nutrem em relação ao candidato José Serra, cujo partido conseguiu destruir a carreira de professor e transformar as escolas estaduais num caos generalizado.

Mas até aqui estamos no terreno do marketing eleitoral, num sistema de participação política que inevitavelmente tende a funcionar como um mercado especial nas sociedades capitalistas. Em resumo, há o investimento numa campanha eleitoral para divulgar um produto político, que é a imagem do candidato e, eventualmente, uma ideia sobre algum assunto que chame a atenção dos eleitores e possa atrair votos; e há o retorno do investimento, que pode ser auferido por uma corrente política no melhor dos casos ou, no pior, por um carreirista individual.