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A grana que ergue e destrói coisas belas

Nas fotos, casais e amigos sorridentes tomam cervejas às mesas instaladas em calçadas diante dos bares. Seriam cenas comuns, exceto pelo fato de que do outro lado da rua funcionava a sede da Gestapo, a polícia política de Adolf Hitler. As fotos registram momentos da vida cotidiana em Munique, berço do nazismo, entre os anos 1930 e 1940, e são mostradas numa exposição organizada pelo Museu do Nazismo, recentemente aberto na cidade. A indagação suscitada pelas fotos é imediata: os sorrisos, os gritos de festa, a comemoração típica de qualquer “cervejada”, quando contrastados com o símbolo da Gestapo tornam-se outra coisa: aquelas pessoas tinham o direito de festejar ali, daquela forma, ignorando solenemente o horror, a brutalidade praticada em câmaras de tortura situadas a menos de 200 metros de suas mesas?

Sim, tinham, de um ponto de vista meramente formal, assegurado pela Constituição de seu país. Mas não tinham esse direito do ponto de vista dos princípios civilizatórios consagrados pela humanidade, ao longo de milênios, durante os quais milhões e milhões de vidas foram ceifadas em guerras e conflitos, princípios sintetizados por Kant na fórmula do “imperativo categórico”. Cada ser humano, diz Kant, deveria agir como se orientado por uma lei universal, válida para ele próprio e para todos os outros; o fim de cada ação deveria ser o de preservação da humanidade, tanto a do próprio sujeito que a pratica quanto a dos outros a quem afeta; finalmente, cada ser deveria ter em mente o bem universal.

Política e moral, sociedade e indivíduos

No início de junho, provocou grande repercussão uma carta aberta escrita por Roger Waters a Caetano Veloso e Gilberto Gil, em que o ex-Pink Floyd pedia aos músicos baianos que cancelassem um show cuja realização estava programada para 28 de junho, em Tel Aviv (capital de Israel). Waters é um dos organizadores do movimento internacional de boicote a Israel (BDS), cujo objetivo é impor o respeito às fronteiras da Palestina anteriores à Guerra dos Seis Dias (1967), e o estabelecimento de negociações que permitam uma paz digna e duradoura. A carta, só na primeira semana de sua divulgação na internet, obteve a adesão de mais de 10 mil pessoas, grupos e organizações.

Gil e Caetano se recusaram a cancelar o show. Isso provocou um novo debate, dentro e fora de Interludium, sobre os limites entre o engajamento em ações motivadas por uma percepção política (no caso, a adesão ao boicote) e atitudes inspirada por valores morais (participar ou não de um ato político); entre a defesa daquilo que é socialmente percebido como justo e a postura ancorada em convicções individuais, ainda quando estas se choquem com o consenso.

Roger Waters pede que Gil e Caetano cancelem show em Israel

O compositor inglês Roger Waters, ex-Pink Floyd, divulgou uma carta em que pede a Caetano Veloso e Gilberto Gil que cancelem seu show marcado para 28 de julho em Tel Aviv (Israel). Ativista da causa palestina, ligado ao movimento BDS (campanha global de boicote, desinvestimento e sanções contra Israel), Waters já convenceu outros artistas a não se apresentarem em Israel. Na carta, ele defende a luta contra as políticas “racistas e colonialistas do governo de ocupação de Israel” e lembra o “ataque brutal de Israel à população palestina de Gaza” em 2014, quando mais de 2.200 palestinos – a maioria civis – morreram na operação israelense “Margem Protetora”, que durou 70 dias. As assessorias de Gil e Caetano informaram que o show será mantido e eles não comentariam a carta.

Na internet, a seção brasileira do BDS promove um movimento chamado Tropicália não combina com apartheid, que já coletou mais e 10 mil assinaturas pelo boicote do show de Caetano e Gil.

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