Uma empresa e um milhão de revendedoras de cosméticos
Ludmila Costhek Abilio (*)
Esta dissertação analisa o trabalho das revendedoras de cosméticos de uma empresa brasileira, e discute a ausência de formas-trabalho dessa ocupação. A Natura é uma das mais reconhecidas e bem-sucedidas empresas brasileiras de cosméticos e produtos de higiene pessoal. A marca tem uma notável visibilidade social; já o mesmo não acontece com as mulheres que realizam no Brasil a distribuição dos produtos em sua totalidade. Denominadas “consultoras”, as vendedoras (a grande maioria é feminina) desempenham uma atividade que para elas se realiza desprovida de regulações públicas e, mais do que isso, que pode nem mesmo ter a forma-trabalho reconhecida.
A relação da empresa com os vendedores baseia-se na ausência de vínculos empregatícios: são juridicamente reconhecidos como “vendedores ambulantes”. A opção de registrar-se como trabalhador autônomo é de responsabilidade do vendedor – em todas as entrevistas realizadas, as vendedoras permaneceram na informalidade. Essa relação de trabalho tornou-se meu ponto de partida para problematizar a informalidade e a exploração do trabalho em suas formas contemporâneas. A centralidade do trabalho para a acumulação capitalista na atualidade estrutura toda a análise.
No primeiro capítulo, são apresentados resultados da pesquisa de campo, por meio da caracterização de tipos sociais, associando-se o perfil socioeconômico e a trajetória ocupacional de algumas revendedoras à sua relação com as vendas. Também são examinados aspectos da produção e distribuição da empresa.
No segundo capítulo, atualiza-se a discussão do trabalho informal no contexto das políticas neoliberais e das reconfigurações das relações de trabalho nas últimas décadas, assim como do regime de dominância da valorização financeira (Chesnais, 2005). São abordados o Sistema de Vendas Diretas e o trabalho feminino nesse contexto. O terceiro capítulo trata da relação entre a marca e o trabalho das revendedoras. Parte-se da marca como o que hoje torna reconhecível o movimento do capital portador de juros (Marx, 1988) e sua relação com as formas contemporâneas de exploração do trabalho. É aprofundada a análise da relação entre dominância da valorização financeira e precarização do trabalho.
No quarto capítulo, essas formas são estudadas mais profundamente; aborda-se a relação entre inovações tecnológicas, trabalho informal e trabalho precarizado. Discute-se também a extensão de uma perda de formas do trabalho que é transferida para a esfera do consumo, examinando-se a imbricação entre trabalho e consumo na atividade das revendedoras, dentre outras atividades. O último capítulo enfoca a subsunção contemporânea do trabalho.
São elementos centrais da análise: as indistinções contemporâneas entre tempo de trabalho e de não-trabalho; as formas atuais de envolvimento subjetivo do trabalhador; uma crítica a teorias do trabalho imaterial, especialmente à de André Gorz (2005); a permanência da teoria do valor para a compreensão da exploração do trabalho. Chega-se então à discussão final sobre a centralidade do trabalho no contemporâneo, esmiuçando-se a relação entre o trabalho das revendedoras e a acumulação da empresa.
Leia a tese de mestrado de Ludmila Costhek Abilio, apresentada em maio de 2011 ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp:
O make up do trabalho : uma empresa e um milhão de revendedoras de cosméticos
* Ludmila Costhek Abilio é graduada em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP (2001) e fez mestrado em Sociologia pela mesma faculdade (2005). Esta tese de doutorado em Ciências Sociais foi apresentada ao Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp em maio de 2011. A foto, de Antoninho Perri, foi tirada durante entrevista de Ludmila ao Jornal da Unicamp, em agosto de 2011.