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Uma faísca chamada Libelu e lembranças de um anarquista

Antônio José Lopes Bigode

A LUTA pela LIBERDADE, que acabou com o atraso, o autoritarismo e a repressão nos legou a DEMOCRACIA que está em risco.

Os anos 1970 (segunda metade) não eram do tipo “anos de chumbo” como foi o período após o AI-5, de 1968, mas nunca foram uma “ditabranda” segundo os donos da FSP. A DITADURA continuava matando: em 1973 “atropelou” Alexandre Vanucchi Leme, em 1975 e 1976 suicidou o jornalista Vladimir Herzog e o operário Manuel Fiel Filho, em 1979 matou o operário Santo Dias, sem falar dos sindicalistas do campo, lideranças indígenas, padres progressistas, pretos e pobres, também mortos, mas longe das manchetes dos jornais.

Em outras palavras, se não foram anos tão duros como os da “era Médici”, os anos Geisel só se diferenciaram de seu antecessor pela escala, isto porque os porões da ditadura se mantiveram ativos e os meganhas, além de não quererem perder a boquinha, não entendiam esta coisa de “abertura”.

O clima de repressão e censura com militares e meganhas em todos os cantos do poder nos assustava nas ruas e em nossas casas. Todos tínhamos medo da Rota assassina, dos infiltrados do DOPS, do Cenimar, do SNI e de outras agências de espionagem e repressão que tiravam nosso sono e contaminavam nossa confiança, o sentido de segurança e otras cositas más.

Mas a Universidade, mantendo sua tradição histórica, sempre foi um espaço criativo de experimentação e resistência. Durante um bom período éramos nós que os assustávamos, com nossa cultura, nossa postura em relação aos costumes (em especial em relação ao sexo), a nossa música, poesia, livros, cinema, teatro, e outras manifestações culturais, tudo isto deixava os milicos e os autoritários em pânico, tal como hoje. Essas eram nossas armas e de certo ponto de vista os vencemos.

Aqueles tempos de Refazendo, Liberdade e Luta, Resistência, Caminhando, Novo Rumo, Vento Novo, Convergência Socialista, Refavela, Inimigo do Rei… foram nossa verdadeira Universidade.

Sou da geração que aprendeu e se formou na luta.

Se hoje somos matemáticos/as, jornalistas, professores/as, físicos/as, sociólogos/as, psicólogos/as, historiadores/as, geógrafos/as, geólogos/as, cozinheiros/as, artistas, poetas, engenheiros/as, computólogos/as, químicos/as, bancários/as, operários/as, atores e atrizes, bailarinos e bailarinas, escritores e escritoras, pais e mães, todos do lado do bem (não, não estou pondo Cristo na conversa), é porque somos fruto daquela Universidade paralela.

Foram tempos memoráveis e tudo o que sou e sei tem, de algum modo, a ver com o que aprendi naqueles tempos de luta, de experimentação e de muita paixão e criatividade.

E viva Glauber Rocha, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Chico Buarque, Jorge Ben, João Bosco e Aldir Blanc, Elis, Elza Soares, Luiz Gonzaga, Adoniran, Jackson do Pandeiro; Pixinguinha, Cartola, Nelson Cavaquinho, Jobim e Vinicius; James Brown e Aretha Franklin; Jimmy Hendrix, Mike Jagger, Beatles, Jim Morrison e Bob Dylan; B. B. King, Nina Simone e John Lee Hooker, Picasso, Bertrand Russel, Chomsky, Malcom X, Ângela Davis, Mandela, Henfil, Gaiarsa, Proudhon e Bakunin, Paulo Freire, Darcy Ribeiro e Maurício Tragtenberg; irmãos Campos e Décio Pignatari, Zé Celso e todos os caras que fizeram minha cabeça.

Viva eu, viva tudo, viva o Chico Barrigudo.


Antônio José Lopes Bigode é professor de matemática da Arco Escola-cooperativa. Na época da ditadura, foi membro do jornal “O Inimigo do Rei”.

Publicado em:História,política

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