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A memória como subsídio para o enfrentamento do cenário político atual

Mesa do ato de comemoração da Frente Única Antifascista (FUA) e dos 91 anos da Batalha da Sé

Com o auditório cheio, Cemap-Interludium promoveu em 7 de outubro o ato de celebração dos 91 anos de um dos principais episódios de resistência operária no Brasil, a Batalha da Praça da Sé, ocorrida na mesma data, em 1934. A nova diretoria e o conselho fiscal da nossa oscip tomaram posse no evento, que também marcou o lançamento do livro Fulvio Abramo, meio século de luta pela 4ª Internacional.

A comemoração foi a primeira atividade pública da nova gestão e teve apoio da Associação Nacional de História (Anpuh) – São Paulo e do Centro de Documentação e Memória (Cedem) da Universidade Paulista (Unesp). O ato aconteceu no auditório da Fundação Editora da Unesp, na mesma Praça da Sé em que, exatos 91 anos antes, a Frente Única Antifascista (FUA) pôs os membros da fascista Ação Integralista Brasileira (AIB) para correr.

A Frente Única Antifascista, formada em 1933 por iniciativa do grupo trotskista Liga Comunista Internacionalista (LCI), uniu organizações sindicais e de imigrantes, grupos de esquerda, anarquistas, socialistas e tenentistas – com a adesão posterior do Partido Comunista do Brasil (PCB) – para combater o fascismo no Brasil. Uma das ações da frente era impedir ou pelo menos atrapalhar todas as atividades dos integralistas. Em 7 de outubro de 1934, a AIB planejava uma manifestação monstro para comemorar seu segundo aniversário. A FUA, é claro, convocou uma contramanifestação para o mesmo local e dia.

O enfrentamento na Praça da Sé também ficou conhecido como a “revoada dos galinhas verdes”, já que, em fuga, os membros do grupo fascista abandonavam suas características camisas verdes pelas ruas do centro de São Paulo para escaparem sem serem reconhecidos. Na época, a FUA foi fundamental para barrar o avanço do fascismo no Brasil, tendo à frente atores que posteriormente fundariam o Centro de Documentação do Movimento Operário Mário Pedrosa (Cemap): entre os quais Fúlvio Abramo e Hermínio Sacchetta.

Novo livro

Cadernos Cemap nº 1, que traz a história da FUA

Considerados marcos da união das organizações de esquerda e sindicais para a luta contra a opressão, a batalha da Sé e o processo de formação da FUA foram narrados por Fúlvio Abramos no livro A Revoada dos Galinhas Verdes, da Editora Veneta. A primeira edição dessa narrativa foi publicada em outubro de 1984, no primeiro número dos “Cadernos Cemap”, de outubro de 1984.

Capa do livro “Fulvio Abramo, meio século de luta pela 4ª Internacional”

No evento do dia 7, foi lançada uma nova publicação com seus relatos, mas desta vez na forma de entrevista: o livro Fulvio Abramo, meio século de luta pela 4ª Internacional, da editora Nova Palavra, apresenta a conversa que ele teve em abril de 1979 com Pierre Broué e Victor Leonardi, em versão inédita em português. Com organização de Alexandre Linares e prefácio de Tiago Maciel, a edição também traz dois textos de Fúlvio sobre a oposição de esquerda e a história do socialismo no Brasil e uma coletânea de imagens, entre as quais algumas raras, doadas pela família. O prefácio de Maciel pode ser lido no site A Terra é Redonda.

Inspirar a luta

“É uma honra ter sido convidada para coordenar o Cemap-Interludium, de poder atuar para que uma parte da memória do movimento operário seja preservada e transmitida às novas gerações, para que possa inspirar a luta”, destacou a socióloga Bárbara Corrales, que iniciou sua gestão como diretora-geral conduzindo o ato.

Bárbara Corrales (esq.) e Lúcia Pinheiro, de Cemap-Interludium
Bárbara Corrales (esq.) e Lúcia Pinheiro.

Segundo ela, ao realizar a posse conjuntamente com a rememoração desse marco da luta operária, a nova diretoria mirou no objetivo de colocar em pauta o debate sobre a experiência vitoriosa dos anos 1930, e, ainda, propor a reflexão sobre como aqueles fatos podem ajudar na análise do momento político atual.

“A FUA, construída naquela vitoriosa atividade da década de 1930, com dezenas de entidades do movimento operário e popular, e baseada na mobilização da classe trabalhadora, é justamente o contrário das alianças que são feitas por cima, por setores da classe inimiga, em nome de alguma frente ampla contra os fascistas. E por meio da qual o movimento operário é empurrado para o imobilismo. Para nós, felizmente, a luta de classes não para”, ressaltou.

O ato

Entre os novos membros da diretoria, compuseram a mesa o diretor de acervo e historiador, Dainis Karepovs, a ex-presidente e diretora de relações institucionais, Lúcia Pinheiro de Santana, e Henrique Ollitta, integrante do conselho fiscal e militante da corrente O Trabalho do PT (seção brasileira da 4ª Internacional). Participaram, ainda, o jornalista e pesquisador Vladimir Sacchetta, o professor Tiago Maciel, José Castilho Marques Neto, um dos fundadores do Cemap e ex-presidente da Editora da Unesp, o vereador paulistano Hélio Rodrigues (PT), e Markus Sokol, presidente do Comitê Nacional da Corrente O Trabalho (PT).

A nova diretoria de Cemap-Interludium, que tomou posse no ato de comemoração da Batalha da Sé

Eles falaram para um auditório repleto, que contou com as presenças de familiares de Fúlvio Abramo, como a socióloga Helena Abramo, e de Hermínio Sacchetta (além de Vladimir, seu filho, sua neta, a documentarista Paula Sacchetta). Douglas Samuel, do Cursinho Popular Padre Ticão, Luiz Gonzaga, o Gegê, dirigente da Central de Movimentos Populares, Guilherme Bizelli, presidente do diretório do PT da Vila Maria, Cristiano Flecha, da coordenação municipal do Diálogo e Ação Petista (DAP) e Maria Ribeiro do Valle, coordenadora do Cedem, também prestigiaram o evento.

Exemplo da FUA

Dainis Karepovs, que atua no Cemap desde sua fundação e trabalhou ao lado de Fúlvio Abramo, abriu as falas, elencando três questões a respeito da atuação da FUA. A primeira delas diz respeito aos ensinamentos deixados pela frente única, em especial o de que não se pode deixar qualquer ação de fascistas sem resposta.

Destacou em seguida a questão da eficácia do enfrentamento, já que os integralistas acabaram alijados do planejamento do golpe de Estado que deu início ao Estado Novo, em 1937. Por fim, ressaltou a capacidade dos que conduziram a FUA, em particular a dos trotskistas, em fazer que tanto as organizações de esquerda quanto os trabalhadores e suas organizações sindicais compreendessem com clareza o que significava o avanço dos integralistas.

Henrique Ollitta, por sua vez, abordou o contexto urbano e político da São Paulo dos anos 1930, e os edifícios históricos ainda existentes, assim como os que já deram lugar a outros, que compunham o cenário, enquanto discorria sobre momentos da batalha nesses locais.

“Essa história está aqui na Praça da Sé. O camarada Fúlvio Abramo, cercado por militantes da LCI, inclusive por sua irmã Lélia, começa a fazer o discurso, subindo num pequeno patamar de um prédio. (…) Que prédio esse? Ele está de pé, nesta calçada, número 158. Hoje eu fui lá”, afirmou, sugerindo ao vereador Hélio Rodrigues a colocação de uma placa alusiva à Batalha da Sé no local.

A participação de Hermínio Sacchetta nas jornadas da luta antifascista foi lembrada por seu filho Vladimir. Já o professor Tiago Maciel sublinhou o objetivo do livro Fulvio Abramo, meio século de luta pela 4ª Internacional, que prefaciou: “Mostrar a linha de continuidade da militância de Fúlvio no combate de mais de 50 anos pela constituição da quarta internacional.”

Ao final, Markus Sokol fez um paralelo do ímpeto fascista dos anos 1930 com o renascimento e crescimento de partidos políticos fascistas nos dias atuais, impulsionados pelo recrudescimento do capitalismo. “Mas não é um fenômeno irresistível, como querem fazer crer os aliancistas. Eu falo daqueles para quem qualquer situação é motivo para ampliar a aliança. É claro que a gente precisa fazer frente única para derrotar o fascismo, mas não é motivo para dissolver nem a nossa identidade, nem nossa plataforma”, encerrou.


Texto de Simone de Marco, diretora de Comunicação. Fotos de Alexandre Linares, diretor do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo e membro do conselho fiscal.

Publicado em:Acervos,Cemap,Cemap-Interludium,História,memória

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